Laura Erber, un poema

[Suomi]

As imagens significam tudo a princípio. São sólidas. Espaçosas.
Heiner Müller


Os poemas são meio surdos e as imagens a princípio

não são de ninguém. O olho é que inflama. A imagem

chuvisca. Os poemas também mas a imagem arrisca.

O poema incendeia, reconsidera, desiste. Nem a espiral

de um ponto de vista ardentemente perseguido nem grãos

de luz sem destino. O olhar exploratório ainda não é a

imagem. Os poemas são sapatos. As imagens emborcam.

Os poemas são ardências, são porradas. Imagens não

perdoam, o poema trespassa. A palavra rompe a mordaça,

a imagem nem sempre resvala, espera. O poema diz

em nome próprio no parco som das cordaturas.

O espaçamento nos libertará do duplo laço? Mas isso

ainda não é o poema. A imagem regateia. Os poemas

persistem. Abelhas e todo um mundo a ser envenenado.

Imagens duplicam antigas provas de existência. São

escamosas, são amargas, são Medéias. Os poemas

são cansaços. As imagens apodrecem. Os poemas são

incensos, esvoaçam. Poemas ofendem. Imagens acusam.

Epifania é um encontro na luz, uma imagem pode ser

isso e ser também o seu contrário. O poema alastra. A

imagem recua. O poema excita. A palavra é gasta, a

imagem encrua. A imagem puxa o corpo pelos cabelos, o

poema, o punho o logro. No poema eu respiro contigo. A

imagem é sempre outra coisa. O poema vela. As imagens

nos despojam do sudário. Tudo começa numa cova

ou na chispa do artifício. A imagem trincha, o poema

entumesce. Acontece no silêncio de uma imagem ser

escudo. O poema é de plástico. A imagem suborna, é o

floema, o influxo, o caldo. Nem todo desenho é imagem.

O arco do poema enverga a prosa. A imagem transtorna,

vem no vento que espalha os papéis. O poema glosa.

O poema é uma devassa, desce pelas coxas enquanto

a imagem diz vem, é agora. O poema na sombra das

coisas. A imagem cheia de moscas. Vem, é agora.



Laura Erber é escritora, artista e editora. Autora de Os corpos e os dias (Editora de Cultura, 2008), Ghérasim Luca (EdUERJ, 2012), Esquilos de Pavlov (Alfaguara, 2013), A Retornada (Relicário, 2017), Mesa de Inspecção do Açúcar e Tabaco (não edições, 2018). 
Realizou exposições na Fundação Miró, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, no Centre international d’art du paysage Île de Vassivière, na França, entre outras instituições nacionais e internacionais. 
Em 2015 fundou com Karl Erik Schøllhammer a Zazie Edições, editora sem fins lucrativos voltada para a tradução e difusão de bibliografia crítica e teórica atual. Atualmente é professora visitante da University of Copenhagen, na Dinamarca. 

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